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Modelo – parecer – ausência justa causa abertura PAD

Processo nº XXXX

 

 

Trata-se de pedido de providências quanto à conduta de servidor público, o qual segundo o Requerente teria supostamente cometido infrações disciplinares, conforme exposto no ofício inaugural.

 

Destaca-se primeiramente a Administração Pública deve atuar, diante do princípio constitucional da impessoalidade, nos autos de processo administrativo disciplinar, de forma isenta e independente de motivação pessoal dos agentes administrativos quanto aos interessados ou acusados, haja vista que devem prevalecer o interesse público e a legalidade, de forma que os feitos disciplinares não podem ser instaurados, processados nem julgados com o propósito de favorecer ou prejudicar os funcionários imputados, pois qualquer desvio de finalidade pode determinar a nulidade dos atos praticados.

 

Certo que a justa causa para a instauração do processo penal também deverá estar presente no âmbito disciplinar, pois a Constituição Federal garante o direito à inviolabilidade da honra, da vida privada e do cidadão, sem distinguir, se ele é ou não servidor público. A existência da justa causa é condição sine qua non para a instauração do inquérito administrativo, pois sem elementos materiais, não pode o administrador público devassar a vida do servidor público sob o pálido argumento de tentar encontrar indícios de uma pseudo infração disciplinar.

 

Nessas condições, somente o exercício irregular das atividades funcionais do servidor público, que desencadeie em descumprimento a deveres ou inobservância a proibições, devidamente comprovados ou que existam forte indícios dessas infrações é que deverão ser apurados: “O uso do poder disciplinar não é arbitrário: não o faz a autoridade quando lhe aprouver, nem como preferir.”[1]

 

Ou como averba José Armando da Costa, sem o fumus boni iuris não há como se instaurar procedimentos disciplinares:

 

“A garantia do devido processo legal não só assegura ao funcionário a feitura do procedimento disciplinar previsto na lei (sindicância e processo ordinário sumário), como exige, por via de consequência, a existência de elementos prévios que legitimem tal iniciativa. Não fosse a exigência desse pré-requisito, os procedimentos disciplinares – estribando-se em meros caprichos do administrador e podendo ser instaurados sem mais nem menos, isto é, sem a existência de indícios ou outros adminículos legais idôneos – a vida funcional do servidor público seria um constante transtorno recheado por uma insegurança jurídica. Daí porque o aspecto mais democrático e importante do devido processo legal é a exigência desse imprescindível requisito de iniciação processual (fumus boni iuris), sem o qual ficaria o servidor público à mercê das trepidações emocionais dos seus superiores hierárquicos, os quais poderiam, assim, infelicitar, importunar e desassossegar os seus subalternos como bem lhe aprouvesse, já que não estariam vinculados a esse pressuposto legal.”[2]

 

Assim, deve haver um mínimo de prova do cometimento de transgressão disciplinar por parte do servidor público. Não basta somente a narrativas de fatos que outro servidor repute como “desídia”, pois se torna necessário o fumus boni iuris para o início do procedimento disciplinar contra quem quer que seja.

 

Esse juízo de valor, mesmo que em sumaria cognição do Administrador Público é obrigado em fazer, sob pena de cometer excesso de poder.

 

Essa garantia de inviolabilidade da intimidade, da honra e da imagem das pessoas retira do administrador a discricionariedade de instaurar procedimento disciplinar contra servidor público sem um mínimo de indício ou plausibilidade de acusação.

 

Não se admite a acusação genérica, sem justa causa:

 

“Com efeito, a necessidade de justa causa para a procedibilidade da denúncia tem o propósito de não submeter o indivíduo a uma situação que expõe sua reputação e imagem se não houver elementos suficientes consistentes que indiquem sua necessidade.”[3]

 

Sem justa causa para a instauração de processo administrativo disciplinar, não estará legitimado o poder público em promover procedimento genérico ou com falsa motivação, para apurar inexistente falta funcional.

 

Diante do exposto, opina-se pelo indeferimento do pedido de abertura de PAD. Encaminhe-se à autoridade superior para deliberação.

 

[1]        J. Guimarães Mengale, O Estatuto dos Funcionários, volume II, Forense, 1962, p. 638.

[2]        José Armando da Costa, Controle Judicial do Ato Disciplinar, Brasília Jurídica, ps. 202/203.

[3]        Luis Roberto Barroso, Temas de Direito Constitucional, tomo II, Renovar, 2002, p. 553.